Quatro tipos de Semeadores
11/08/2024
Algum tempo atrás ouvi uma mensagem sobre este texto (Mateus 13.1-9), com um enfoque diferente do que sempre é abordado. Este direcionamento soou-me deveras relevante e fez-me refletir sobre nossa responsabilidade como pregadores do Evangelho, principalmente em contexto transcultural, para que a Palavra de Deus caia de fato em boa terra e frutifique com abundância.
Partindo deste pressuposto, julgo importante identificarmos os tipos de semeadores que com maior frequência deixam a preciosa semente cair à beira do caminho, em solo pedregoso, entre os espinhos e na boa terra, para que possamos direcionar o nosso trabalho de forma que a semente lançada produza os frutos esperados pelo Senhor da seara. Entendo que não somos capazes de sempre lançar a semente em boa terra, até porque o apóstolo Paulo nos exortou a “pregar a palavra a tempo e fora de tempo, quer seja oportuno quer não”, mas penso que esta reflexão nos ajudará no direcionamento de nosso ministério de maneira que a semente caia prioritariamente em boa terra e frutifique.
1. O semeador displicente e despreparado para essa tarefa - v. 4
Este tipo de semeador é o que com maior frequência deixa a semente cair em solo duro, ficando exposta e fácil de ser raptada antes de sua germinação. E, conforme nos disse Jesus, quando a Palavra é pregada a pessoas despreparadas para ouvi-la, vem o inimigo (Satanás) e facilmente a arrebata antes que o ouvinte a receba.
No contexto geral da pregação, entende-se que o obreiro despreparado ou displicente, não percebe os diversos tipos de solo e lança a semente aleatoriamente, deixando-a cair em solo duro e impróprio para germinação. Isso se aplica aos que fazem a obra de Deus apenas por profissão ou por formalidade e não gastam tempo preparando-as para receber a Palavra que produz arrependimento e fé no Senhor Jesus.
No contexto transcultural a situação é ainda mais séria, devido às barreiras linguística e antropológica. Pregar a Palavra sem conhecimento da língua materna e sem entender os conceitos culturais de uma etnia alvo corre-se o risco de transmitir uma mensagem incompreensiva ou deturpada. Isso porque, segundo estudos sobre comunicação, o código linguístico é apenas 50 % da mensagem transmitida; os outros 50 % têm a ver como o contexto cultural do ouvinte e sua experiência de vida. Como exemplo cito a experiência comunicacional entre um grupo indígena no Pará com falantes de outra língua usando o português. Estes apontavam para o céu e diziam “Deus, Deus” e os ouvintes repetiam “Taiwit, Taiwit” que significa ‘espírito dos antepassados’, ou seja, a mensagem fora interpretada de acordo com o filtro cultural do ouvinte e não com o que tentavam comunicar.
É o que chamamos na missiologia de “evangelização por confrontação” quando a mensagem chega apenas ao intelecto e acaba provocando uma reação contrária ou indiferença à mensagem proferida nos corações endurecidos pelo pecado e pelo sistema religioso em que estão inseridos.
Portanto, assim como o solo duro da beira do caminho pode ser arado e adubado tornando-se uma boa terra, entende-se que os corações empedernidos pelo pecado e por falsas crenças podem ser trabalhados, a partir do testemunho cristão e na demonstração do amor de Cristo mediante um relacionamento saudável e respeitoso com esse público-alvo.
2. O semeador preguiçoso e acomodado – v. 5-6
Conforme nos disse Jesus nestes versículos, o solo rochoso é também inapropriado para frutificar. Embora a semente chegue a germinar, acaba sucumbindo às intempéries do clima porque não aprofundou suas raízes.
Portanto, o que lança a semente em solo rochoso é o que, por preguiça ou acomodação e sem se preocupar com o resultado, não prepara o terreno antes de lançar a semente. E a exemplo de alguns tipos de solos pedregosos no Brasil que, quando devidamente trabalhados pelo agricultor, produzem com abundância, creio que essa mesma estratégia pode ser aplicada ao Reino de Deus.
Neste contexto podemos identificar este tipo de semeador como aquele que faz a obra de Deus relaxadamente. É o que faz a “evangelização sem contextualização”, não se preocupando em conhecer a língua e os conceitos culturais que direcionam as crenças de determinado povo. Neste caso, embora as pessoas recebam a mensagem com alegria, esta pode ficar apenas no plano intelectual e não atingir a sua cosmovisão, provocando um simples nominalismo religioso ao invés da verdadeira conversão.
Portanto, à luz desta abordagem, importa que sejamos obreiros diligentes e proativos, investindo tempo de qualidade no relacionamento com as pessoas, aprendendo sua língua e buscando conhecer os seus padrões culturais, inclusive, iniciando o processo do discipulado, mesmo antes delas se converterem, como fez Jesus com os seus discípulos. Este pode ser um processo eficaz na retirada das pedras em seu caminho, preparando-os para receberem o Evangelho, a permanecerem na fé e frutificarem.
3. O semeador infiel e negligente – v. 7
O semeador que lança a semente entre espinhos pode ser identificado como aquele que não gasta tempo cultivando a seara, deixando que as ervas daninhas (os espinhos) sufoquem a planta e deixando-a infrutífera.
No contexto do evangelismo transcultural, classificamos essa estratégia como “evangelização por conformação”, quando as pessoas apenas a acrescenta ao seu sistema de crenças, sem que as mudanças essenciais às suas vidas sejam efetivadas. Com isso, o crescimento da Igreja fica sufocado pelos padrões culturais contrários ao padrão de Deus.
Isso também se aplica ao evangelismo sem discipulado em qualquer cultura, razão por que tantas pessoas fazem uma decisão por Cristo, mas não perseveram na fé. E, mesmo permanecendo na igreja, tornam-se obstáculos ao crescimento do corpo de Cristo. Doutra sorte, quando o obreiro negligencia o processo de disciplina, o pecado continua florescendo e prejudicando a vida da igreja, ou até mesmo comprometendo a sua existência, como tem acontecido em várias partes do mundo.
4. O semeador fiel e comprometido com o Senhor da Seara – v. 8
Entendo também que este tipo se enquadra no grupo daqueles que levam a sério o seu trabalho, preparando devidamente o terreno para a semeadura, cultivando-o mediante todo o processo de limpeza do solo e de adubação, razão por que essa semente produz eficazmente como Jesus nos ensinou.
Este é o processo de “evangelização por contextualização” e se dá, quando nos dedicamos a aprender a língua dos falantes nativos e sua cultura para, de forma contextualizada, podermos eficazmente comunicar a palavra de Deus. Isso porque, cada cultura possui semelhanças, contrastes e vazios em relação à mensagem bíblica. As semelhanças são pontes culturais que podem ser usadas como ponto de partida para a comunicação do Evangelho, a exemplo do “Deus desconhecido” usado por Paulo em Atenas, na apresentação do Evangelho naquela cultura (Atos 17:16-31). Os contrastes são conceitos e práticas culturais que não condizem com o ensino da Palavra de Deus e precisam ser mudados na vida dos convertidos. Já os vazios são conceitos bíblicos que não existem naquela cultura e que precisam ser preenchidos pelo ensino fiel da Palavra de Deus, promovendo salvação e a santificação de suas vidas.
Porém percebo que esses aspectos, não ocorrem apenas no contexto transcultural, pois mesmo mudando de um Estado para outro dentro de um mesmo País, conceitos culturais e religiosos precisam ser estudados e analisados de forma a podermos comunicar eficazmente a mensagem bíblica. Dessa forma, estaremos lançando a semente em boa terra e em plena condição de frutificarem.
Concluindo posso dizer que, à luz desta abordagem teológica e com os recursos antropológicos e missiológicos disponíveis em nossos dias e na dependência da ação do Espírito Santo, poderemos ser capacitados a lançar a boa semente em boa terra a qual virá a produzir os frutos esperados pelo Senhor da seara. Isso porque, como o solo duro da beira do caminho e o terreno pedregoso podem ser preparados para receber a semente, as pessoas precisam também ser preparadas para receber o Evangelho. E, assim como o agricultor fiel e diligente cultiva bem a sua plantação, retirando as ervas daninhas que querem sufocar a planta que germinou, o discipulado eficaz e a aplicação da disciplina na Igreja podem também fazer com que os convertidos cresçam espiritualmente e frutifiquem “a cem, a sessenta e trinta por um” conforme nos disse o Senhor Jesus.
Onésimo Castro
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