Olympia e Renée - Duas “heréticas” na Corte Italiana
02/12/2024
Quem era aquela menina de apenas 22 anos chorando sobre o leito do seu pai moribundo? Quem imaginaria que ela era tida como a mulher mais culta de toda a Europa? Assim que seu pai morresse, a vida de Olympia sofreria uma profunda mudança. Naqueles últimos momentos com seu pai, os pensamentos da jovem confrontavam quaisquer resquícios de dúvidas que ela poderia ter sobre a nova fé cristã, que ela vinha conhecendo na corte da família D’Este, em Ferrara, na Itália: “Como poderia meu pai enfrentar a morte com tanta segurança e certeza de que receberia a vida eterna?”.
Desde os 12 anos de idade, ela conversava em grego e latim fluentemente. Com 15 anos, discursava e dava palestras na corte. A cidade de Ferrara tinha Olympia como a sua pedra preciosa mais reluzente. Quando seu pai fora chamado para dar aula ali, Olympia recebera a oportunidade de acompanhar a educação da pequena Ana d’Este, filha de Renée da França e Ercule d’Este, Duque de Ferrara.
Quando se casara, a Duquesa Renée da França logo fez de Ferrara um centro da cultura renascentista. A Reforma Protestante transtornava a Europa, mas ainda não se fazia tão explícita no norte da Itália naquele momento. O pai de Olympia fora alcançado pelo evangelho, porém, recordando daquele tempo, Olympia confessa: “Oh! quão necessária foi a provação para mim! Eu não tinha gosto pelas coisas divinas; ler o Antigo e o Novo Testamento não me inspirou nada além de repugnância”. Aquela menina que recitava Cícero de cor aos 4 anos e que escrevia poesias e trabalhos acadêmicos aos 15 anos, não via na Bíblia nada que lhe falasse ao coração. Com a morte corajosa de seu pai, os pensamentos de Olympia encontram finalmente a convicção que ainda lhe faltava.
O que Olympia não notara é o quão comprometida com a nova fé estava a Duquesa Renée. Por meses, ela recebera em Ferrara o próprio João Calvino. Renée foi responsável pela distribuição das Institutas da Religião Cristã. Ela promovia debates sobre a fé cristã na corte e incentivava Ana e Olympia a participarem, mas a conversão de Renée não fora acompanhada por seu marido, que assumira o Reino em 1534 e precisava do apoio do papa Paulo III. Então, o Rei Ercole denuncia sua esposa ao Tribunal de Inquisição.
Olympia perdera o pai e também sua melhor amiga e protetora, Ana d’Este, que se casou e foi embora de Ferrara. Quando a Inquisição se volta sobre a corte, sua primeira vítima foi a própria Olympia, que abraçara o calvinismo. Casando-se com Andreas Gundler, um médico protestante, ela se muda para Schweinfurt, na Baviera. Na sua nova casa, Olympia mantém intensa troca de correspondências com muitos reformadores, entre eles Lutero, Melanchton e Calvino. Entretanto, durante a segunda guerra Margrave, Schweinfurt é invadida pelo exército e totalmente incendiada.
Andreas e Olympia fogem sem levar nada e muitos dos seus escritos se perdem para sempre. Depois de quilômetros em fuga, chegam a Heidelberg. Nesse ponto, Olympia se encontra muito doente, por causa da peste. Porém, à semelhança de seu pai, a jovem agora enfrenta a morte com a certeza da vida eterna: “Desejo ser dissolvida, tão grande é a confiança da minha mente, e estar com Cristo em quem minha vida floresceu”. Olympia falece em outubro de 1555, aos 29 anos.
Renée, por muito tempo, viveu encarcerada em sua própria casa. Sua situação piora, quando recebe a ceia protestante, recusando publicamente tomar os elementos na missa, que ela julgava uma blasfêmia. Renée foi condenada à prisão por heresia e teve suas filhas tiradas de seu cuidado. Ela só pôde retornar para casa, quando seu marido morreu, mas seu filho, Alfonso II, que assumira no lugar do pai, também não seguiu a fé da mãe e não a recebeu em Ferrara. Renée se muda para a França, onde pode fazer de seu castelo um refúgio para os que sofriam perseguição religiosa na Europa, até mesmo salvando a muitos durante o massacre da “noite de São Bartolomeu”. Renée falece em 12 de junho de 1575, na França.
Olympia e Renée, condenadas como heréticas, perderam tudo o que tinham na corte real de Ferrara, porque, pela fé, aguardavam a cidade que tem fundamento.
Fábio Ribas
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